Ácido cianídrico, espilantol, tucupi, jambú e maniçoba: a complexa química da cozinha paraense



A culinária paraense é a mais genuinamente brasileira, por sua influência indígena, e emprega amplamente a mandioca, alimento de fácil cultivo e rico em amido.

Os cultivares mais usados são a mandioca mansa, aipim ou macaxeira (Manihoc utilissima) e a mandioca brava ou amarga (M. esculenta). Das raízes da mandioca brava é obtido o caldo amarelado conhecido como tucupi, usado no famoso “pato no tucupi”, enquanto que das folhas moídas da mandioca mansa, acrescidas de carnes defumadas, faz-se a maniçoba, ou a feijoada paraense. Todos acompanhados dos vários tipos de farinhas geradas destas raízes.

Ambos os pratos tem um elemento comum no seu preparo: o longo tempo de cozimento das partes da mandioca, em média de 4 a 6 dias. Dado da cultura popular remanescente da tradição indígena, tem como objetivo eliminar o ácido cianídrico presente nestas espécies. O HCN (gás) é gerado quando a planta é moída, descascada ou amassada, pela hidrólise da limanarina, um glicosídeo cianogênico. Esse gás é empregado pelas plantas para se defender do ataque de predadores. Para o ser humano, o cianeto é um veneno que reage com a hemoglobina, impedindo a circulação de oxigênio pelo sangue e levando à morte rápida por intoxicação. A mandioca brava libera um teor bem maior de HCN do que a mandioca mansa, e por isso exige cuidados na alimentação de animais e no preparo de sua farinha.

Mas não para por aí. A culinária paraense ainda faz uso abundante das folhas do jambú (Acmella oleracea) no preparo ou acompanhamento destas iguarias, deixando seus apreciadores literalmente de água na boca e, algumas vezes, de lábios moles. É que o jambú possui, em sua composição, uma substância conhecida como espilantol, uma alquilamida com propriedades anestésicas e que provoca excesso de salivação. Na Amazônia, o chá de suas folhas é usado como anestésico bucal e para dores de garganta.

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